Forte e grande, montanhosa

Tchau, Recife.

Steffi de Castro
4 min readApr 10, 2023
obrigada por tanto sol, recife

Quando decidi sair da minha ilha, eu não sabia exatamente qual era o motivo. Fui a uma consulta espiritual, e questionei sobre a viagem, sobre se tinha tomado a melhor decisão, considerando que foi uma decisão meio de sopetão, tomada à base de choro, cansaço de tudo e enfim… Na consulta, o sacerdote falou que seria ótimo para mim, mas que eu deveria saber por que estava vindo. Eu tinha acabado de ter o coração partido, mais uma vez. Mas não queria que a decisão de sair da ilha do amor fosse, justamente, a falta de amor. Embora fosse uma peça grande no quebra-cabeça. De toda forma, eu teimei (e que bom) e não admiti que era por isso, tratei de procurar outra justificativa e disse pra mim mesma: “estou indo para encontrar cura”. Então, vim focada nisso. Vim focada em me curar. Escolhi Recife por tantas coisas e no final por quase nenhum motivo ao mesmo tempo, mas havia muitos para continuar por aqui e por isso escrevo com essa sensação de luto prévio. Os primeiros meses foram difíceis, só chovia, e eu me sentia só como nunca antes. Dessa vez de verdade. Sozinha literalmente. Depois o sol se abriu, eu encontrei uma terapeuta que me ajudou bastante, comecei a fazer meus movimentos buscando as coisas que eu queria e gostava: dançar, sair, me divertir, conhecer pessoas, aprender a tocar. Foi bom. Trabalhei muito também, quase cheguei ao esgotamento físico e mental. Não adoeci, e foi por um triz, porque foram muitas as sessões de terapia em que eu chorava dizendo que estava cansada e envergonhada por não estar vivendo Recife. Ok, passou. Acho que até isso foi necessário, sabe? Eu nunca desenvolvi tanto meu potencial como nesses últimos meses. Eu não vim pra Recife para conhecer Recife, não me entendam mal. Eu não vim pra viver Recife, eu vim pra me curar e foi isso que aconteceu. Mas quando deu, quando consegui viver Recife, eu vivi e gostei! E sou grata por isso. Sou grata por ela ter sido o lugar que meu coração escolheu pra ser tratado. Não fiz tantos grandes amigos, conheci muita gente amorosa e que eu gosto e quero rever, não deu tempo de conseguir aprofundar relações, meu tempo era escasso e então não fiz aquelas amizades de grudar, sabe? que pena, mas não me distraí de mim e era disso, hoje eu vejo, que eu realmente precisava. Agora, que estou finalizando esse ciclo aqui, consigo traçar uma linha do pedacinho da minha história e desenvolvimento pessoal que aconteceu nesse lugar. Mesmo não tendo completado 1 ano (mas eu tinha vindo pra passar só 3 meses e passei 6 meses a mais rs), eu posso dizer que este período aqui me transformou completamente. Parece até que estou sei lá, romantizando demais uma coisa que nem é tanta coisa assim? “Ah, me poupe, você só passou alguns meses em outra cidade, todo mundo faz isso”. É verdade. Mas, honestamente, eu fiz de um jeito muito único pra mim e só eu e os meus sabemos como isso foi importante. Consigo dizer exatamente o dia que anotei tudo o que estava me magoando, e depois tudo o que eu aprendi com cada coisa, pra chegar à conclusão: é preciso aprender a viver sem dor. Foi aqui que aprendi isso. Foi aqui que posso afirmar que aprendi a viver sem dor, foi aqui que aprendi a me amar muito mais. Sou grata porque aqui eu gostei tanto de mim, e espero levar isso comigo. Tive chateações, decepções, dias tristes, dias doentes… E nada disso me abalou, nada disso me derrubou, nada disso me destruiu. Eu fiquei forte e grande, montanhosa. E agora finalmente tenho chorado muito de alegria. Hoje uma ficha gigantesca caiu em cima de mim: eu me curei. E eu estou tão feliz com isso, tanto! Eu não consigo ver como minha existência pode retroceder a partir daqui. Eu só consigo me ver mais, e melhor, e mais forte e maior— e pode acontecer (e vai) coisas ruins, a vida é assim, mas eu estou bem. Eu já estou bem. Pode vir que eu aguento. Sou grata aos domingos, aos finais de tarde, à melhor erva natural que fumei (risos), à Olinda fora dos dias de carnaval, à praia do Pina, ao bregafunk, aos museus, às cirandas, ao coco, ao bons beijos e bons sexos, à percussão, à música, à praia… Eu sei que é realmente hora de ir embora, porque eu falava que não tinha motivo para voltar definitivamente à minha ilha, não havia nada de novo lá pra mim. E agora vai ter. Exatamente o motivo que eu dei pra não voltar, veio atrás de mim. E então entendi que foi preciso um afastamento maior, um “isolamento” mais bem pensado (porque a mania de me isolar eu sempre tive), me afastar, sentir outros lugares, me ver sozinha, não ter a quem recorrer, chorar, trabalhar, me apaixonar por minha rotina, ficar distante da minha família, dos meus amigos, de quem eu amava. Foi preciso um tempo de mergulho, um tempo de uma solidão e solitude. Eu precisei gostar de ser minha própria companhia, me apaixonar por mim, porque eu só tinha eu. Agora que aprendi, acabou. E começou. Obrigada.

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